A Associação Brasileira de Etnomusicologia (ABET) torna público o seu imenso pesar em relação ao sinistro ocorrido na noite do dia 2 de setembro de 2018.

 

O Museu Nacional do Rio de Janeiro foi a matriz da Ciência brasileira, tanto pelo cuidado de nossa memória material, quanto imaterial. Ali estava um acervo de extrema relevância para diversas áreas do conhecimento, destacando-se raridades como coleções de múmias egípcias, vasos gregos e etruscos e o crânio de Luzia, um dos mais antigos esqueletos humanos das Américas. Na área de música, material de recolhas pioneiras, como cilindros com as gravações de música indígena realizadas por Edgard Roquette-Pinto, cujas melodias seriam utilizadas como tema em diversas composições de Villa-Lobos, e o acervo etnológico de Helza Cameu, autora de Introdução ao Estudo da Música Indígena Brasileira, além de um grande número de instrumentos indígenas e africanos. O Museu Nacional viu florescer a Etnomusicologia, berço que foi de grandes pesquisadores que hoje atuam no Brasil e no exterior.

 

A sede da instituição, que acaba de completar 200 anos, foi residência da família real e imperial brasileira. O edifício carecia há tempos de investimentos infra estruturais, não recebendo desde 2014 a verba anual referente à sua manutenção. Um terço das salas estava fechada ao público. Um investimento do BNDES por ocasião do bicentenário e outra negociação encaminhada traziam a esperança de restauro e reabertura de algumas das principais salas até 2019, ainda no âmbito das comemorações. Lamentavelmente, chegaram tarde demais.

 

O que fica é mais um alerta aos nossos dirigentes para a necessidade de pensar estrategicamente a ciência e a cultura a longo prazo, investir na construção e preservação do nosso patrimônio, não deixando chegar a situações críticas, nas quais o resultado é sempre mais dispendioso e menos eficiente. É urgente, sobretudo, a necessidade de estímulo do grande público ao convívio com a produção de nossas instituições científicas e culturais. As vozes, não poucas, ainda precisam de reforços.

 

Algumas aqui se manifestam:
Diretoria ABET – gestão 2017/2019
Suzel Ana Reily – Presidente
Hellem Pimentel Santos Figueiredo – Vice-presidente
Estêvão Amaro dos Reis – 1º Tesoureiro
Renan Moretti Bertho – 2º Tesoureiro
Flávia Camargo Toni – 1ª Secretária
Guilhermina Lopes – 2ª Secretária
Edilberto José Macedo de Fonseca – Editor
Marília Raquel Albornoz Stein

Diante do espetáculo dramático das chamas engolindo o Museu Nacional e, com ele, uma parte importante da ciência e da memória nacionais, a Academia Brasileira de Ciências, a Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência, bem como as sociedades cientificas abaixo mencionadas, manifestam tristeza e indignação e conclamam a sociedade brasileira a participar ativamente da defesa do patrimônio cultural e científico da nação brasileira.

Como se já não bastasse a ameaça para o futuro da nação associada aos severos cortes orçamentários, que têm afetado o desenvolvimento científico e tecnológico do país, agora esvai-se a memória do passado, matéria prima essencial para a construção da identidade nacional.

A morte do Museu Nacional tem um significado simbólico que vai além dessa imensa perda para a cultura brasileira. Pois outros ativos também estão perecendo: com muita preocupação acompanhamos a desindustrialização do país, a precariedade da educação científica no Ensino Médio, o sucateamento de laboratórios de pesquisa de universidades e de outras instituições de ciência e tecnologia e o êxodo de jovens pesquisadores, fruto de uma política econômica que ignora o papel essencial da ciência, da educação, da cultura e da inovação no desenvolvimento de um país. Que trata recursos para C&T como gastos, e não como investimentos com alto poder de retorno, contribuindo para aumentar o PIB e o protagonismo dos países no mundo contemporâneo.

Neste momento de luto, no qual nossas entidades se solidarizam com os colegas pesquisadores, servidores e estudantes do Museu Nacional, impõe-se um esforço concentrado para reconstruir o Museu Nacional. O objetivo não será certamente a impossível reconstrução das coleções perdidas ou dos irrecuperáveis tesouros históricos e científicos que têm alimentado a pesquisa nessa instituição. Será, sim, a reconstrução de uma ideia que o fogo não devora, de um Museu que sirva de referência para as futuras gerações, repetindo a fórmula que esteve presente na sua história, de um acervo histórico e científico apoiado na pesquisa científica, reunindo assim indissoluvelmente a memória e a investigação, o passado e o futuro.

É preciso, com urgência, liberar recursos emergenciais para o Museu Nacional, garantir a segurança do imóvel atual, estabelecer locais de trabalho adequados para os pesquisadores, e possibilitar a ampliação do espaço do museu, adjudicando o terreno próximo já reivindicado pela direção do Museu, deslocando assim do Palácio as atividades administrativas, de pesquisa, de guarda de coleções e de ensino de pós-graduação. Isso, aliado a dotações orçamentárias adequadas para o futuro, permitiria a continuidade da instituição, com suas atividades de ensino e pesquisa, a realização de exposições públicas, com os serviços vinculados de museologia, divulgação científica e de assistência ao ensino.

As chamas que devoraram o Museu Nacional enviaram uma mensagem de alerta para a sociedade brasileira. Para salvar o patrimônio histórico, cultural e científico do país são necessárias medidas concretas e o estabelecimento efetivo de políticas públicas, como aquelas propostas no Livro Azul da IV Conferência Nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação. É fundamental que sejam tomadas ações adequadas e urgentes para salvar a ciência, a tecnologia e a inovação no País. Urge impedir que essas chamas se alastrem e consumam o futuro do Brasil.

Academia Brasileira de
Ciência – ABC e Sociedade Brasileira Para o Progresso da Ciência – SBPC